O final de Todo Mundo Odeia o Chris e sobre Viver em uma Prece

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6 min readDec 26, 2020

Era uma vez, não muito atrás… Um jovem casal que vivia na esperança de dias melhores… Tommy trabalhava nas docas, mas o sindicato estava em greve fazendo ele abrir mão de sua válvula de escape que era a música, pois teve penhorar o seu violão. Gina, trabalhava o dia todo em um restaurante e mesmo pensando em fugir, levava o pouco dinheiro que ganhava para casa. Quando ela chorava a noite, Tommy dizia que algum dia tudo iria ficar bem e ela respondia:

“Nós temos que nos agarrar ao que temos, porque não faz diferença se vamos conseguir ou não. Nós temos um ao outro e isso já é muito, por amor, nós vamos tentar.”

Tommy e Gina no videoclipe It’s My Life da banda Bon Jovi, 2005.

Mesmo sobrevivendo por um fio, Tomy e Gina sabiam que tinham que ser fortes e suportar, estando preparados ou não, porque vivemos pela luta quando e a luta é tudo que temos, vivemos em uma prece… A história de Tommy e Gina é a história da maioria de nós e por isso ela fez e faz tanto sucesso até hoje. E ela nos foi contada pela primeira vez em 1986, durante todas as dificuldades que a população americana enfrentava na era Reagan, pela banda de rock Bon Jovi em seu segundo single Livin’ on a Prayer. Segundo o compositor Jon Bon Jovi, Livin’ on a Prayer (Vivendo em uma Prece, em tradução literal), fala sobre viver na esperança de dias melhores, nos agarrar ao que temos e a quem temos e não deixar de enxergar um futuro melhor independente dos acontecimentos.

Quem sabe muito bem o que é viver em uma prece e na esperança de dias melhores é um casal bem conhecido por nós brasileiros e que me lembra bastante Tommy e Gina: Julius e Rochelle.

Tyler James Williams e Chris Rock, 2007.

Todo Mundo Odeia o Cris é uma das séries de tv mais famosas e adoradas do mundo. Lançada em 2005 e finalizada em 2009, a história foi criada pelo ator, comediante, roteirista, cineasta, ganhador de quatro prêmios Emmy e três prêmios Grammy e considerado como o quinto maior humorista de todos os tempos, Chris Rock. Baseada em sua vida real, durante a infância e adolescência nos anos 80. Ao longo de quatros temporadas Chris e sua família conquistaram a crítica especializada, diversos prêmios e uma legião de fãs ao redor do mundo e alguns fãs que ficaram insatisfeitos com o final — um tanto estranho e confuso — da série.

Durante o último episódio da quarta temporada “Todo Mundo Odeia Dependência Escolar” acompanhamos a jornada de Chris para tentar passar do primeiro ano do ensino médio, pois devido a uma média de atrasos durante o período o escolar ele terá que fazer dependência no próximo ano, sendo assim, Chris recorre a prova do supletivo. Na última cena, vemos Chris em uma lanchonete esperando sua família e escolhendo uma música na juke box da mesa. A primeira a se juntar a ele é Rochelle e logo atrás de um estranho homem entram Drew e Tonya. A música começa a tocar e os quatros cantam esperançosos:

We’ve got to hold on to what we’ve got/ ’Cause it doesn’t make a difference if we make it or not/ We’ve got each other and that’s a lot/ For love, we’ll give it a shot/ Oh, we’re halfway there/ Oh, oh, living on a prayer/ Take my hand, we’ll make it, I swear/ Oh, oh, living on a prayer

Temos que nos agarrar ao que temos/ Porque não faz diferença se conseguiremos ou não/ Nós temos um ao outro e isso já é muito/ Por amor, nós iremos tentar/ Oh, estamos quase lá/ Oh, oh, vivendo em uma prece/ Segure a minha mão, nós vamos conseguir, eu juro/ Oh, oh, vivendo em uma prece

O diretor de cinema Lev L Spiro como o estranho homem que observa Chris no último episódio de Todo Mundo Odeia Chris.

Enquanto isso, o homem estranho fica observando e encarando Chris e Julius estaciona o caminhão na frente da lanchonete, a câmera foca no número 735 escrito no veículo. Julius entra com o resultado do exame e antes que Rochelle diga qual foi a nota, a série simplesmente acaba.

Chris precisaria tirar 800 pontos de 1000 para conseguir passar, mas de acordo com a pista que nos foi dada com o número escrito no caminhão, ele tirou 735, não conseguindo passar. No entanto, o homem estranho que observava Chris era um grande caça talento que perambulava pelas ruas de Nova York procurando novas estrelas a serem descobertas. Ele que descobriu o Chris Rock e o agênciou, levando aos palcos do stand-up. No ano que a série se passava quando chegou ao fim, foi no mesmo ano em que o pai de Chris Rock morreu devido a uma complicação durante uma cirurgia e, para não estragar toda a comédia da série, os produtores decidiram não continuar, até porque, sem Julius a série perderia o rumo.

O final de Todo Mundo Odeia o Chris faz uma referência a toda a história contada desde a primeira temporada, a família Rock mesmo com todas as dificuldades que enfrentavam, sempre tinha uns aos outros no final do dia, sempre se agarravam ao que tinham, mesmo quando as coisas não saiam como planejados eles continuavam, como Tommy e Gina, “vivendo em uma oração”; na esperança de dias melhores. E por isso que Chris escolheu Livin On a Prayer, por isso que junto com sua família ele cantou cheio de esperanças os mesmos versos cantados por Jon Bon Jovi; porque a mensagem era essa, as coisas nem sempre serão como planejado; alguns sacrifícios serão necessários; a vida nos leva para o caminho que devemos seguir, mesmo que, no momento, aquilo não seja o que queremos e o mais importante: é preciso nos agarrar ao que temos e a quem temos.

Família Rock cantando Livin On a Prayer da banda Bon Jovi no último episódio de Todo Mundo Odeia o Chris, 2009.

Imagine se Julius e Rochelle não se esforçassem tanto para proporcionar uma boa educação para seu filho? Chris poderia ter seguido outro caminho como muitos personagens de seu bairro que vemos ao longo da série; ou se Chris não tivesse aguentado tudo o que passou durante o período escolar e desistido da escola? E se ele tivesse passado no supletivo e não tivesse seguido a carreira de stand-up até se tornar Chris Rock, o quinto maior comediante de todos os tempos? Eu não sei o que seria dele, mas sei o que seria de mim e de milhares de pessoas que cresceram assistindo Todo Mundo Odeio o Chris, perderíamos um companheiro, um exemplo, uma referência de personagem, de família e de bairro e tanta coisa boa que essa série nos proporcionou!

Todo Mundo Odeia o Chris, 2005.

Seja pelo elenco de peso com atuações dignas, um roteiro simples, mas inteligente, inovador e cheio de referência, Chris Rock dividiu com a gente a sua história, que é a mesma história de Tommy e Gina, que é a nossa história também. A história de quem vive em uma prece, esperando por dias melhores, não desistindo do futuro em meio a tantas dificuldades que encontramos no caminho.

Sigamos em frente!!!

Videoclipe da música It’s My Life da banda Bon Jovi, 2000.

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“Da leitura era preciso tirar outra sabedoria. Era preciso autorizar o texto da própria vida, assim como era preciso a construir a história dos seus.”